Thursday, May 10, 2007




O Nosso herói, afinal, é uma lagosta
banda sonora: the B-52's - Rock Lobster
"Iniciando a leitura d'"O elogio do fracasso", quero partilhar convosco a dor que é ler isto. O primeiro parágrafo descreve sapateiras e lagostas amontoadas como calhaus de algum templo havaiano, a metáfora é, tal como o resto do capítulo e suspeito o livro, fraca e com um sentido de visualização reduzido. Primeiro a religião predominante do Havai é, como todos sabemos, o cristianismo, por isso o templo não deverá ser muito diferente do normal e depois...porquê um templo havaiano?

A primeira intervenção do nosso herói é em direcção ao empregado – "leve sorriso cruzado de esgar" – e depois o pensamento completo de sorriso de quem "não está disposto a dar-lhe trela para prosseguir com uma longa palestra sobre psicologia crustácea". Bom, assim que o nosso narrador cria toda uma imagem de aquário de restaurante, para onde o nosso herói olha fixado para, no primeiro momento possivel, sacrificar e criticar o empregado como sendo aborrecido. Bom é verdade que falar de sapateiras e lavagantes é aborrecido, mas quem começou foi ele, fixado como parvo a olhar para o aquário.

As primeiras páginas, passadas num restaurante "A pérola de Cacilhas", são dedicadas ao contexto social do herói, aparentemente é uma daquelas familias que vai almoçar fora aos domingos enquanto se vê à rasca para pagar a quinta prestação do renault 5, o almoço de domingos é o que prende o herói à familia, (será um sagrado ritual de templo cacilhence?) e o domingo é descrito como "a Guernica de beatas retorcidas despenhadas no cinzeiro sob os narizes enjoados de frituras vaporosas" (mas alguém me explica o que são narizes enjoados de frituras vaporosas?).

A primeira conversa com os pais, não tem qualquer densidade psicológica, respostas evasivas a perguntas inocentes da mãe sem qualquer desenvolvimento da personagem sobre o conforto com que enfrenta o seu contexto familiar. No fim da pequena conversa, a conclusão. "todos somos crustáceos" (temo que o autor esteja a ser autobiográfico com a sua familia nesta afirmação).

De repente os nomes, a mãe chama-se matilde, o nosso herói, infelizmente, Francisco. . Depois de tentar pagar o jantar ao pai (é estagiário, vive sozinho, paga almoços à familia, não está mal de finanças este estagiário), vive na calçada da Ajuda.

Aqui, vem o pior do capítulo, a Paula. Todas as personagens que até agora apareceram são estereotipadas, o que não seria chocante se não fossem desprovidas de sabor, a Paula tem a idade do herói, fuma no templo budista por baixo do apartamento dele, é casada com um idiota qualquer que passa a vida em viagens de negócios e, obviamente, tem um romance quente com o nosso herói, cruzar-se com ela era "o meu momento zen do dia".

Uma frase, tenho de vos deixar, bem sei que isto vai ficando grande mas é mau demais para não citar "Depressa nos tornámos amantes. Alguma lei natural o impunha, provavelmente a mesma que faz dois besouros caídos numa poça de chuva agarrarem-se mutuamente, como se isso os impedisse de afundar" . O homem devia era ter citado no inicio do livro a introdução do dto. da concorrência do Ascensão.

Obviamente a Paula fica caídinha por ele enquanto o valente herói (recuso aceitar que se chame Francisco) a despreza e quer acabar com ela. Em conclusão, as personagens são nulas em densidade psicológica, e ridiculamente estereótipadas. A secundaridade das personagens roça a irrelevância perante o herói brilhantemente iluminado, de forma a livrar-se delas, atribui-lhes tarefas mecânicas sem relevância (A irmã passa a vida a brincar ao telemóvel – a horrenda e super-acutilante critica social a gerações mais novas - , os pais são "white trash", a Paula amante roça o ridiculo enquanto personagem). Poucas pistas são dadas quanto ao herói e em si contraditórias, identifica-se com os pais e sente-se motivado a manter-se na conversa de mesa após almoço, curiosamente, mantem uma critica ao contexto social com o qual não quebrou laços, de onde só podemos concluir que ele julga-se melhor que eles e mantém um horrível cinismo com a familia. Contudo nada disto transparece do texto. A figura de estilo que, infelizmente, abunda, é a metáfora mas para nosso azar os comparantes escolhidos são rebuscadamente fracos e muitas vezes, a semelhança induzida entre os dois elementos é parca ou inexistente. Não raro, não vai além da comparação ou longos e aborrecidos exemplos.

Momento do capítulo: "Aquele ritual de conchas escarlates roçando num compasso dorido parecia de facto um acto de compaixão, uma dança derradeira de consolo para a [caranguejola] recém-chegada, em que todos carpiam um destino comum e encomendavam as almas ao deus das criaturas moles encalhadas em casquinhas, aspirantes a copiosas parrilladas".

1 comment:

Anonymous said...

Mesmo sendo o livro uma merda como dizes, por alguma razão ele consegue editar um romance e ter centenas ou milhares de pessoas a comprar, enquanto tu ocupas o tempo a escrever um bloguezinho que ninguém lê.
Este texto cheira mais a dor de cotovelo que a qualquer outra coisa! Vê se te mancas!